No cenário do Direito Tributário, o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) desponta como uma proposta interessante para simplificar os processos e incentivar a regularização fiscal. O ANPP funciona como um estímulo à auto-regularização por parte dos contribuintes, pois além de resolver definitivamente o ato delituoso, evitando uma eventual condenação, busca conscientizar e orientar os envolvidos, incentivando-os a corrigir as irregularidades tributárias de forma voluntária.
Essa abordagem objetiva promover a cultura da conformidade fiscal, estimulando os contribuintes a cumprirem suas obrigações sem a necessidade de medidas punitivas extremas. No entanto, é crucial analisar criticamente essa abordagem, pois em alguns casos a sua aplicação pode gerar conflitos ainda maiores entre o Estado e os contribuintes.
De forma geral, o Ministério Público, em vez de oferecer denúncia em relação ao suposto crime tributário, poderá propor ao contribuinte investigado um acordo (ANPP) pelo qual será necessária a confissão formal de ter praticado a sonegação (ou outro crime), prestar serviços à comunidade ou entidades públicas, dentre outras possíveis condições, além de ter de reparar o dano, ou seja, pagar o tributo, para só assim evitar a condenação penal.
A crítica em relação ao ANPP reside justamente na exigência de reparação do dano, que, no caso de crimes tributários, é justamente o pagamento do tributo. Atualmente, a reparação do dano como condição de acordo de não persecução penal de crimes contra a ordem tributária é muito criticada, pois o tributo deve ser objeto de execução fiscal, não existindo legitimidade do Ministério Público para negociar débitos tributários.
Afinal, o mero pagamento do débito, no âmbito administrativo, já é causa extintiva da punibilidade, enquanto o seu parcelamento constitui causa suspensiva do processo. Assim, em se tratando de crimes contra a ordem tributária, a “reparação do dano” ocorreria com a constituição definitiva do tributo devido, sendo exigida na esfera de execução fiscal.
Desta forma, no caso específico dos crimes contra a ordem tributária, o ANPP deveria ser estipulado de forma dissociada da ideia do pagamento do tributo – chamado, neste caso, de reparação do dano – dado que o adimplemento da obrigação fiscal deveria ser viabilizado pela via processual própria.
Apesar de o acordo de não persecução penal, no Direito Tributário, se apresentar como uma proposta que visa a simplificar processos e estimular a conformidade fiscal, é fundamental abordar de forma construtiva os desafios relacionados a essa opção, sendo imperativo estabelecer critérios rigorosos para garantir que os acordos sejam firmados somente em conformidade com o que é possível dentro das competências de cada órgão, evitando sobrepor a competência do Estado em cobrar o tributo pelos meios próprios, como atualmente tem sido feito.
* Rafael Conrad Zaidowicz é contador e advogado, respectivamente, da Zaidowicz Contabilidade Empresarial Ltda e Zaidowicz & Soares advogados.